quarta-feira, 5 de novembro de 2014

Apenas a mesma história contada milhões e milhões de vezes....


Temos uma distinção dual do mundo, que aprendemos ainda muito cedo. Percebemos que existe um “eu” e o “outro”. O eu, representa a própria consciência, percepção de vida e o molde psicológico que utilizamos para interpretar o mundo. O outro é o resto. Tudo que é externo a nossa prória existência.  E fim. Enviesados por tão patética percepção do mundo, superestimamos nossa importancia por obviamente sermos o centro do nosso universo. Bastante óbvio, já o que deveria ser mais importante? Porém não é este o problema. O problema é que ao invés de nos mudar para sermos mais eficientemente felizes em contrapartida com o mundo exterior, ou por outro lado, mudarmos o nosso ambiente para que se adapte melhor nossa existência, desistimos de ambos.
 Como remédio utilizamos de 2 estratégias para evitar de encarar nosso próprio fracasso: A primeira opção, seria filtrar todos as desventuras , inconsistências e infelicidades da vida e simplesmente, finge que não existem. Nega-se a realidade. Apoia-se nas instituições novas e velhas que cultuam a vida e a felicidade: religião, posição social, cultura, dinheiro. Colocando o óculos que melhor case, que tem lentes de cores fixas e desfocadas para contrastar e dar falsa impressão de colorido ao universo cinzento. Não, você não é importante. Não, o que você faz não é importante. Sua morte não fará falta a muita gente e em poucos anos não fará falta a ninguém. Você não tem talento. Você não é especial. Deus não te ama. A vida de aventuras que pinta, a existência importante, o modo de ver as coisas diferente dos outros é tudo uma grande bobagem. Você não é ninguem. Ou pior, é apenas alguem. Não que a existência seja um inferno, mas está longe do céu. É tudo um meio termo morno e chato pra quem tem sorte. Pra quem não tem, é uma luta longa e invencível.
A segunda maneira seria o oposto, e devo confessar a que cometo com mais propensão. Utilizar todo infortúnio, toda adversidade, cada revés, numa bandeira como forma de provar que o “outro”, o externo, são um boicote contra seu “eu”. Sofre o dia-a-dia, incapaz de se libertar da menor das decepções. Isenta-se de culpa, agindo como vítima do próprio destino, chorando pelos cantos rezando por atenção, pena e mamadeira. Ninguém liga para seus problemas. Todos temos os mesmos. Você não é especial. Seu sofrimento não é maior do que o de ninguém. Você só chora mais, por qualquer coisa. Infelizmente, não é o mundo que deve ser adapatar a você, e sim você que deve se adaptar ao mundo. Então levanta essa bunda e vai caçar um modo de melhorar. Mas você não quer melhorar. Onde estaria então, seu proclamado direito a miséria de espírito e lamúria?
Intercalamos entre tais estados de espírito, tendo uma tendência maior para um ou outro. Vamos nos arrastando com maior ou menor empolgação, desimportantes, irrelevantes e ignorados. Porém há tragédias que são também bênçãos e vice-versa. Nossa insignificância nos dá liberdade para vivermos e morrermos como bem entendemos dentro dos limites dos grilhões das circunstâncias. Você pode fazer o que quiser, porque no fim das contas, ninguém dá a mínima.

sexta-feira, 6 de junho de 2014

Da lua

Da lua,
não há nada.
Vê-se da janela
a luz amarela
do apartamento em frente.
Reflete no vidro,
mimetizando o belo satélite.
O sol,
da mesma forma,
não forma imagens ou sombras,
não há luz ou calor
que nos toque diretamente.
Sentimos que está lá,
nalgum lugar.
Entre muros e concreto,
entre paredes e tijolos.
Sabemos, pois é quando
os interruptores se tornam desnecessários.
Por isso,
inevitável o relógio.
Que nos conte
quando começa e acaba
o dia.
Na nossa precisão
imposta por nós mesmos.
É desnecessário o guarda,
o carcereiro,
o juíz,
o advogado.
Somos juízes e executores
de nossa própria sentença.
Decididamente
perpétua.

quarta-feira, 14 de maio de 2014

Abalada

 
Tenho evitado pensar. Nunca ajudou-me em nada, apenas serviu para despir as virtudes de tudo e mostrar que a pele nua das coisas exibe não beleza, mas deformidades. Quando tudo que é externo perde o sentido e torna-se vazio, olhar para dentro igualmente não oferece saída. O ensimesmamento encarcerado mina a vontade. Se o que está ao alcance dos braços e dos sentidos nada nos oferece, ao olhar por trás dos olhos em busca de sauvação e abrigo choca-se com o demônio. O desespero abafa os sentidos e congela os músculos. Há de haver uma saída. Um recurso para afastar a mente de si mesma, e esse todos conhecemos: o vinho.
De tal maneira compreendido, não há muitos caminhos a seguir. Findar-se agudamente com veneno, ou lentamente com álcool. Rasgar os panos que cobrem tudo que o cerca, mas para isso há de se estar igualmente nu. Sangrando alvejado por todos que não toleram o ultraje de ter a linha que separa a pela da máscara questionada. Ou tornar-se estúpido dando atenção aos sentidos e sendo subserviente ajuntando-se ao rebanho. O último sendo o mais fácil e menos doloroso. Porém, a voz que grita em sua cabeça há de ser calada. E o que sobrará? Um corpo sem alma vagando pelo espaço. Sem brilho nos olhos e com movimentos automáticos robotizados. Sem dor, mas sem paixão. Sem dúvida e sem vontade. O teatro e a mentira não importam. A verdade, muito menos.
E quanto a mim? O que tenho feito? Adiado. Permaneço parado no tempo e espaço enquanto os anos correm, irresoluto, ausente de coragem, lasso, incapaz de seguir qualquer trilha. A tarefa aduz o risco em pensar. Onde mais podem nos levar nossos demônios senão para o inferno? Entre as diversas possíveis escolhas, a escolha que faço é não escolher. Enquanto isso percorro poucos metros em todas as direções possíveis experimentando e reservando aos sentidos o direito de deliberação, mas sempre garantindo a possibilidade de voltar ao ponto inicial. Infortunadamente, para ir longe, em algum momento há de se abdicar do caminho de volta.


segunda-feira, 17 de junho de 2013

Nas Ruas

Bastava abrir uma cerveja num bar qualquer ou apenas um suspiro impaciente durante a espera infinita de uma fila, para escutar de um transeunte, as mesmas velhas reclamações: “esse país é um absudo”, “brasileiro é trouxa mesmo”, “ ninguém quer saber de política, só de futebol”, “ninguém faz nada, ninguém reclama”. Todas essas conversar, repetidas e revividas com diferentes protagonistas e vilões, teve sempre o mesmo fim. Um sentimento de injustiça e indignação, um grito entalado na garganta e uma sensação de desengano. De estar fadado a um destino de infortúnios.
Pois bem. Em plena Copa das Confederações, véspera de Copa do Mundo, estamos mostrando que não somos trouxas e pacatos. O Movimento Passe Livre, já se manifesta em SP faz um tempo. Porém a atitude da PM representando a resposta do estado às reivindicações, demonstrando total falta de consideração, diálogo e respeito às pessoas foi um tapa na cara dos Brasileiros. Ou melhor, um tiro de bala de borracha na cara. Os sentimentos tantas vezes vividos e acumulados nos pontos de ônibus, nas filas do posto de saúde, na violência diária civil ou policial, na violência da pobreza e em tantos incontáveis momentos extrapolaram os limites da pele e o grito preso, libertou-se.
Gostamos de futebol, sem dúvida. Mas o futebol não nos leva e traz ao serviço. Não nos atende no hospital. Não educa nossos filhos. Todos nós brasileiros temos plena consciência disso. Sempre foi uma distração. Uma maneira de pararmos um pouco de pensar nas mazelas do dia-a-dia e descansar o coração pesado de sofrimento com uma futilidade. Agora, o maior tiro no pé da política, o “pão e circo” mais ineficiente da história provou o ponto. Colocamos em cheque, (não apenas no Brasil, é uma tendência mundial) a efectividade da tão prometida democracia. Na época da monarquia, os Inconfidentes reagiram ao ‘Quinto’ que era pago à coroa, acreditando ser um abuso. Hoje, pagamos um democrático imposto de 40%, o dobro, obrigatório sob o risco de violência. Portanto, estamos nas ruas exigindo os resultados prometidos por essa ideia mágica, que até então, apenas nos iludiu.
Pode ser que nada mude, pode ser que isso não leve a lugar nenhum, infelizmente. Porém, não resta dúvida de que aqueles que estão no poder e nos vigiam pensarão duas vezes antes de desafiar e tratar feito idiotas toda uma população. Ademais, mostra um meio prático e eficiente de exigir mudanças, exigir que sejamos tratados com respeito. A principal modificação antes que alterações concretas ocorram, é cultural. Isso está acontecendo. Por volta de 1700 os EUA era uma das nações mais pobres do mundo. Mas a guerra de independência e os eventos que se seguiram, influenciaram os valores políticos e econômicos da cultura americana, que abriu precedentes para o tremendo avanço de tal nação. A ideia de que a democracia tem necessariamente que ser participativa, que não é apenas votar uma vez por ano, seria o maior fruto do presente movimento. Portanto, não me resta senão, ficar cheio de esperança. Estamos de saco cheio, e mais unidos do que nunca. Se esse ultraje contra o povo continuar, a Bastilha irá cair. Cabeças hão de rolar.


quinta-feira, 30 de maio de 2013

Uma língua

Uma daquelas semanas, em que todas as tarefas postergadas durante o semestre acumulam para serem resolvidas em poucos dias. Dormindo mal e comendo pior, o cansaço colocava em dúvida a minha capacidade de manter o ritmo. Quinta-feira, 21:30 na estação a espera do metro. A cabeça lutava para racionalizar tudo que ainda faltava, mas de certa forma aliviada pelas tarefas já resolvidas.
Andando em meio às pessoas impacientes pelo veículo que nunca chegava, seguia uma miúda, como dizem por aqui. Passos curtos e ligeiros, tentando acompanhar a mãe, devia ter por volta de 4 a 6 anos de idade. Observando tudo e a todos com um interesse que só as crianças têm, antes de se tornarem enfadonhas e chatas como o resto de nós. Passou, me encarando. Minha mente sobrecarregada e agora mais ainda com a tarefa de questionar quanto tempo levaria para que finalmente alcançasse o sono, tentou sem sucesso entender o que aquele olhar significava. E antes que chegasse a qualquer conclusão, a expressão da face a minha frente se altera, e ela me mostra a língua. 
Aquele gesto me acertou. Fiquei um tempo pasmo pelo trato de desdém a que fui submetido, e não tive outra reacção senão rir com vontade. Eu, concentrado nas minhas ocupações presumidamente importantes, recebi, por obra da eventualidade, a resposta da devida relevância de meu ofício.

Foi a interacção humana mais sincera que tive em dias. 

quarta-feira, 10 de abril de 2013

Em defesa da vadiação


Não é novidade para ninguém que a cultura tem um peso enorme em nossas ações e ideias. O que impressiona é como algo intangível nos influencia ao ponto de termos como certamente nossos, valores que nos foram introduzidos imperceptivelmente. Com o feriado, uma amostra de tal valia, acabou por revelar-se.
Por mais que passe dias de folga lendo, escrevendo, desenhando, tocando violão, assombra-me um sentimento de inutilidade. Como se não estivesse produzindo nada. Como se fosse meu dever como ser humano nessa terra, produzir alguma coisa. E pior, como se o que eu faço com meu tempo livre fosse não apenas absolutamente irrelevante, mas também de alguma forma, prejudicial.
Mesmo que ler, escrever, tocar um instrumento musical, realizar tarefas domésticas ou até as ocupações mais supérfluas como passar o dia deitado assistindo desenhos animados sejam fundamentais para crescimento cultural e qualidade de vida, é fatal a sensação de vadiagem e procrastinação. Porque não há horários a serem cumpridos, não estou executando tarefas, obedecendo a ordens e ninguém irá avaliar meu desempenho. O tipo de função que ocupa nosso tempo, gerando a sensação de que somos importantes e necessários. Ledo devaneio. Jamais desperdiçarei tantos dias quanto no trabalho ou em todos os níveis escolares que me atarefam desde sempre.
Porém ao ponderar, percebo que o pior de tudo, não é o sentimento de inutilidade que citei inicialmente. E sim o de culpa por não compartilhar o juízo de que eu deveria me preocupar em ser eficiente. Como se cada minuto do meu dia deva ser empenhado em algo que obtenha um resultado tido como relevante por outrem, que possa ser exibido para que prove o meu valor. Pudesse eu viver de vadiação, o faria. Se bem que se me conheço, até nisso seria incapaz de me dedicar com afinco. 

sexta-feira, 5 de abril de 2013

Até longo meu amigo.


E em um segundo secular,
Você sente que tudo mudou.
Que a terra já não é mais redonda.
Não que as dificuldades e afazeres corriqueiros,
tenham ficado piores.
São os mesmos de sempre. Com a mesma exigência
e empenho.
Mas agora, está sozinho.
E não nada que faça tudo ser mais penoso e triste
do que estar sozinho.
O que dava graça e beleza às horas
se fora.
E você, mesmo sem querer,
principalmente sem querer,
Se vê obrigado e endurecer.
Já não há mais tanto riso.
Nem mesmo lágrimas.
É endurecer, ou desistir de tudo.
Até logo, meu amigo.